Durante muitos anos Aníbal Machado foi o escritor inédito mais conceituado do Brasil. Publicava na imprensa alguns ensaios, trechos do famosíssimo João Ternura e contos dispersos que, sem a unidade em volume, impediam uma avaliação global do escritor. Apesar do ineditismo, exercia imensa influência nos meios literários cariocas, um papel semelhante ao desempenhado por Mário de Andrade em São Paulo. Sua casa de Ipanema era ponto de reunião de escritores, jornalistas, sambistas. Mas o livro sempre aguardado ia ficando para as calendas gregas. Com a piblicação, afinal, de Vila Feliz, em 1944, o público leitor descobriu que estava diante de um dos maiores contistas brasileiros de todos os tempos. O volume reunia apenas cinco contos (classificados como novelas) de excepcional qualidade, elaborados e reelaborados ao longo de muitos anos, numa ânsia permanente de perfeição. Em verdade, o livro já nascia clássico, com pelo menos duas obras-primas, Tati, a Garota, e A Morte da Porta e a Estandarte. Quinze anos depois, nas Histórias Reunidas, Anibal acrescentava à lista de suas obras-primas mais dois trabalhos, O Iniciado do Vento e Viagem aos Seios de Duília. Os demais, se chegam a tanto, são porém inesquecíveis. Quem se esquecerá da pequena epopéia doméstica contada em O Piano ou de O Defunto Inaugural, cujo o enterro é quase uma festa? Dessa forma, a sua obra completa de contista, trabalhada ao longo de mais de 30 anos, resume-se a doze trabalhos, soldados entre si por uma atmosfera muito peculiar, entre concreto e imaginário, realidade e sonho, meio surrealista, meio fantástico, mas sem jamais perder a coerência psicológica. A análise psicológica dos personagens, aliás, é penetrante, mas sem crueldade, antes com simpatia, ternura, piedade por suas fragilidades, tudo amenizado por uma intensa carga de poesia.