Gérard de Nerval, ao lado de Poe e Baudelaire, é uma das mais estranhas culminâncias da civilização europeia que chega à metade do século XIX. Nos seus poemas, dá-se a um só tempo o esgotamento das formas clássicas, sua constrição e expansão máximas no empenho de expressar arquétipos e mitos essenciais à visão de mundo do seu criador, como o divórcio (ou a viuvez) maior entre os resultados estéticos ou técnicos alcançados e a situação existencial, humana, contingente do poeta. Aquela atinge o ápice de uma glória quase sobrenatural e, desse modo, extravagante, burlesca; este mergulha no inferno depressivo, na tragédia voluntária e inelutável. Mas, ao contrário dos outros dois irmãos gigantes assinalados, que contribuíram ativamente para mudar o rumo da literatura ocidental, imprimindo-lhe a riqueza de um realismo já crítico e fantástico, Nerval se fecha sobre si mesmo, é solitário por excelência, sequer parece considerar tanto a sua contemporaneidade quanto a sua posteridade, e mal se recordaria se não tivesse surgido em terra e língua fecundas, abertas à experiência nova, ao trato original da criação estética.