Aprendendo a viver é uma seleção das crônicas mais confessionais escritas por Clarice Lispector na década de 70. Organizado por Pedro Karp Vasquez, o livro reúne uma série de textos em que a escritora conta sua própria vida. É Clarice Lispector na primeira pessoa, detalhando passagens marcantes de sua história, divagando sobre os temas mais variados, revelando particularidades de seu cotidiano e esmiuçando seu processo criativo. Com ele, a Editora Rocco celebra os 40 anos de publicação de A paixão segundo G.H., romance que representa um divisor de águas na obra da autora e que hoje é considerado um clássico da literatura brasileira. Os textos reunidos em Aprendendo a viver foram publicados originalmente no Jornal do Brasil, entre agosto de 1967 e dezembro de 1973, período em que Clarice Lispector assinava uma crônica semanal no diário carioca. A escritora aproveitava aquele espaço das formas mais variadas: ela discutia acontecimentos recentes, filosofava sobre a existência, tratava de acontecimentos cotidianos e até antecipava trechos de seus romances inéditos. Em 1984, esse vasto material foi reunido no livro A descoberta do mundo. A partir desta obra, a editora Rocco cuidadosamente selecionou as crônicas mais confessionais de Clarice Lispector para dar forma à delicada autobiografia Aprendendo a Viver. Para o novo livro, o editor Pedro Karp Vasquez escolheu apenas os textos em que Clarice falava sobre sua vida. São crônicas surpreendentemente confessionais de uma escritora que dizia ser um mistério até para si própria. "Nesta nova compilação, este rico material não está em ordem cronológica de publicação", Pedro explica. "Como são relatos pessoais de Clarice, eles foram dispostos tendo a vida da autora como fio condutor. Assim, o livro começa com ela falando sobre sua infância no Recife, passa pela adolescência, a vida adulta, o casamento, a maternidade, a carreira e termina com as reflexões que Clarice fez sobre a morte" um dos últimos textos se chama Desculpem, mas se morre. Apenas ao fim do volume é informada a data de publicação original de cada uma das 218 crônicas reunidas. E há também uma cronologia com os principais fatos da vida de Clarice, para que o leitor possa contextualizar melhor tudo o que leu. Desta forma, Aprendendo a viver faz as vezes de autobiografia de Clarice Lispector, repleto de revelações pessoais que ajudam até mesmo a compreender melhor a inigualável obra literária que ela deixou. No livro, ela conta, por exemplo, que nunca superou o sentimento de culpa pela morte de sua mãe. Clarice foi gerada numa época em que se acreditava que a gravidez podia curar uma mulher doente, mas seu nascimento não evitou que sua mãe morresse, dez anos depois. Ela fala das humilhações de que foi vítima na infância, cogita a origem de sua necessidade de proteção masculina, revela quais foram os livros que marcaram cada fase de sua vida e rejeita o rótulo de intelectual "Ser intelectual é usar sobretudo a inteligência, o que eu não faço: uso é a intuição, o instinto", ela diz. Clarice garante que nem mesmo culta ela era, pois lia pouquíssimo e nem tudo que lia era bom. Há trechos de extrema beleza. O leitor descobre que Clarice, apesar de casada e com filhos, passava as noites de Natal na companhia de uma amiga solitária, sempre em restaurantes cheios, para que ela visse quanta gente sozinha havia no mundo. Também é encantador quando Clarice se imagina lendo seus próprios livros em outra encarnação, sem saber que foi ela mesma quem os escreveu, numa outra vida. Ou quando ela se mostra incapaz de comer algo que tenha plantado, por amor ao ser vivo que ajudou a criar. Mesmo quando Clarice fala de banalidades, seu texto nunca é frívolo. Sua narrativa pode começar com um relato sobre um cisco no olho e evoluir para uma reflexão sobre a vida, a morte, o amor, o infinito, a mentira. Ela escreveu numa crônica sobre sua viagem ao Egito: "Vi a Esfinge. Não a decifrei. Mas ela também não me decifrou. Encaramo-nos de igual para igual. Ela me aceitou, eu a aceitei. Cada uma com o seu mistério. Não é à toa que a obra de Clarice é tão estudada por filósofos e psicanalistas", diz Teresa Montero, autora de Eu sou uma pergunta, biografia de Clarice Lispector publicada pela Rocco. Aos pesquisadores da obra de Clarice, talvez interessem mais os textos em que a autora fala sobre seu ofício. Ela explica que suas histórias se desenvolviam à medida que ela escrevia, e nasciam quase sempre de uma sensação ou de uma palavra ouvida. Quando um romance surgia inteiro na sua cabeça, este nem chegava a ir para o papel, ficava só no título, por ela considerar desestimulante escrever sobre o que já sabia. Em dado momento do livro, Clarice reclama dos que a consideram uma escritora hermética: "Quando escrevo para crianças, sou compreendida, mas quando escrevo para adultos fico difícil? Deveria eu escrever para os adultos com as palavras e os sentimentos adequados a uma criança? Não posso falar de igual para igual?" Por vezes, ela até mesmo cogita abandonar a literatura: "Quem sabe, também eu já poderia não escrever? Como é infinitamente mais ambicioso. É quase inalcançável." Teresa Montero destaca a importância das crônicas compiladas em Aprendendo a viver: "Em se tratando de sua vida privada, Clarice era extremamente reservada. O curioso é que, nessas crônicas, ela acabava se revelando muito. No próprio texto ela demonstra sua surpresa ao constatar que escreveu sobre coisas que não tinha intenção de expor. Clarice se recusava a fazer uma autobiografia porque acreditava que sua literatura não deveria servir de catarse. Ela dizia: ‘Para desabafar, eu tenho os amigos, mas me disseram que eu deixo escapar certas coisas." Estas crônicas mostram o modo como Clarice via o mundo, e hoje são estudadas por pesquisadores de toda parte. Além disso, é relevante considerar que esse espaço semanal que Clarice assinava no jornal foi responsável, em grande parte, por sua popularização. Através destas crônicas, muita gente teve acesso ao trabalho da escritora pela primeira vez." O melhor é que este primeiro contato não deixava a desejar em qualidade literária, se for feita uma comparação entre as crônicas e os romances de Clarice. Os textos apresentados em Aprendendo a viver são de rara beleza. Como este trecho, ao mesmo tempo poético e confessional: "Comecei a mentir por precaução, e ninguém me avisou do perigo de ser tão precavida; porque depois nunca mais a mentira descolou de mim. E tanto menti que comecei a mentir até a minha própria mentira. E isso já atordoada eu sentia isso era dizer a verdade. Até que decaí tanto que a mentira eu a dizia crua, simples, curta: eu dizia a verdade bruta."Organizado por Pedro Karp Vasquez, este livro reúne uma série de textos em que a escritora conta sua própria vida. É Clarice Lispector na primeira pessoa, detalhando passagens marcantes de sua história, divagando sobre os temas mais variados, revelando particularidades de seu cotidiano e esmiuçando seu processo criativo. Os textos aqui reunidos foram publicados originalmente no Jornal do Brasil, entre agosto de 1967 e dezembro de 1973, período em que Clarice assinava uma crônica semanal no Diário Carioca. A escritora aproveitava aquele espaço das formas mais variadas - ela discutia acontecimentos recentes, filosofava sobre a existência, tratava de acontecimentos cotidianos e até antecipava trechos de seus romances inéditos.Organizado por Pedro Karp Vasquez, este livro reúne uma série de textos em que a escritora conta sua própria vida. É Clarice Lispector na primeira pessoa, detalhando passagens marcantes de sua história, divagando sobre os temas mais variados, revelando particularidades de seu cotidiano e esmiuçando seu processo criativo. Os textos aqui reunidos foram publicados originalmente no Jornal do Brasil, entre agosto de 1967 e dezembro de 1973, período em que Clarice assinava uma crônica semanal no Diário Carioca. A escritora aproveitava aquele espaço das formas mais variadas - ela discutia acontecimentos recentes, filosofava sobre a existência, tratava de acontecimentos cotidianos e até antecipava trechos de seus romances inéditos.