Escrever é uma vastidão dormente: espaço desértico, areia contra a pele, secura na garganta, morte e abutres sob a cabeça. O poeta caminha nesse terreno e de seus olhos arregalados a paisagem é esgarçada em vida. Felipe Julius tem essa maneira de ver atravessada pelo que não se vê. Foram talvez os anjos revoltados, está repleto da dissonância dos grandes livros, são acordes desencontrados, intervalos aumentados e diminutos se completando numa voz melódica, harmonioso. Falamos aqui da arte do contraponto Bach, da polifonia de Villa Lobos, do cruel Artaud, do absurdo de Beckett, das imagens derretidas de Piva. A pergunta feita em nossas caras: preservar a tradição/é realmente mais importante/do que investir na singularidade? Creio que não, melhor ver Mallarmé pichado num muro, uma sinfonia tocada numa gaita de camelô e as praças sendo transformadas em hortas públicas. Os marketplaces, a inconsciência admitida, o suco do capitalismo e a pachorra de nenhuma caridade a nos (...)