Total é a guerra absolutamente sem quartel, sobre a qual se abate a presunção de chumbo de que todos sejam combatentes: homens e mulheres, de meninos a velhos, válidos ou inválidos. E em que todos são alvo, portanto. Ninguém é inocente. Procedimento ilegal à sombra de tratados que remontam ao meado do século XIX, a agregação dessa nuança sombria aos conflitos modernos é escrita que fica por conta do sabre, não da pena. Frederico Pernambucano de Mello Místico religioso como querem alguns, ou um homem de certo nível cultural e de inteligência aguda, como defendem outros, Antonio Conselheiro reuniu jagunços, ex-escravos, beatos, mulheres e crianças e pôs em xeque as forças e a organização do Exército Brasileiro. Líder da Guerra de Canudos um dos episódios mais importantes que marcaram a queda da Monarquia e a instituição da República no Brasil Antonio Conselheiro esteve à frente de um grupo de pessoas humildes que, mesmo acuado pela perspectiva imposta por uma realidade perversa, ousou acreditar na possibilidade de uma vida mais justa. No livro A Guerra Total de Canudos (selo Escrituras, 3a edição revista e ampliada), Frederico Pernambucano de Mello afirma que a passagem dos 118 Anos desse episódio da nossa história precisa evitar o caminho apenas ruidoso de celebrações anteriores, para se fazer motivo de estudo da cultura brasileira como Gilberto Freyre recomendava: com mais pontos de interrogação e menos pontos de exclamação. É nessa linha que esse estudo procura inscrever-se, diz o autor. Manuel Correia de Andrade, no prefácio do livro, ressalta que no ano em que chegamos aos 118 Anos do episódio da destruição de Canudos, arraial em que fanáticos e jagunços tentaram desenvolver uma sociedade diferente da que existia no Estado brasileiro, tendo pago caro por sua divergência, é muito oportuna a reedição nacional do ensaio de Frederico Pernambucano de Mello. A obra analisa, entre outras questões, as causas remotas e próximas do conflito, plantadas, aquelas, na falha de colonização que privilegiava as zonas econômicas exportadoras; as características dos meios natural e social sertanejos, indo até a questão alimentar; a presença do Norte e do Nordeste no esforço de guerra, o que é feito pela primeira vez; a visão, sob tantos aspectos, superior de Antônio Conselheiro; como o problema da presença de negros ex-escravos no arraial de Canudos; e, finalmente, o papel desempenhado pelo Exército, despreparado, na época, para agir em uma região desconhecida e sem ter um sistema de apoio para a tropa em ação. Compendiando a matéria conhecida e revelando aspectos novos, difíceis de obter nessa altura do tempo, o estudo de Frederico Pernambucano de Mello, com a isenção que caracteriza a sua obra de historiador, tem lugar de destaque nas revisões com que estará transcorrendo mais um aniversário dessa guerra trágica, sintetiza o intelectual Manuel Correia Titular da Cátedra Gilberto Freyre, da Universidade Federal de Pernambuco.