A tradução da palavra grega ascese para o português é exercício. Escrito em parágrafos curtos, que muitos estudiosos da obra comparam a versículos bíblicos, "Ascese" de Nikos Kazantzákis é um exercício espiritual. Em carta ao escritor Pandelis Prevelákis, Kazantzákis diz que não se trata de obra de arte literária ou filosófica, mas que constitui certamente o mais dilacerante brado de sua vida, um brado de busca e temor, um grito da alma (vide prefácio). De difícil classificação, este poema-ensaio-grito dá-se na forma de um denso monólogo interior, em que o autor trata com elegância e concisão de temas que lhe são caros e que estão presentes em muitos de seus romances, como "Vida e proezas de Aléxis Zorbás" (Grua, 2010), "A última tentação" (Grua, 2015) e "O Cristo recrucificado". Kazantzákis enxerga o homem como campo de batalha em que alma e corpo, sagrado e profano, finito e infinito, efêmero e permanente estão em constante tensão. Desde o verme cego no fundo do oceano até a arena infinita da Galáxia, apenas um está em combate e se encontra em perigo: o nosso próprio eu. A edição, que contém prefácio crítico de Silvia Ricardino, manteve o subtítulo original em latim, Salvatores Dei, que quer dizer Salvadores de Deus. Para o autor, é com a construção do eu individual, desse homem inquieto que ferve e age, que se reconstrói Deus.