"Este livro nos mostra uma face oculta, o outro lado da lua no cinema brasileiro, uma história que, por décadas, foi contada na mão única do recorte dominante, deixando de lado a questão de gênero e, particularmente, a dimensão da participação feminina. Não seria a mulher o grande "outro" do cinema brasileiro, já que a questão da alteridade diferencial lhe parece intrínseca e irreconciliável? Certamente não se trata da única cissura, mas sua invisibilidade é escandalosa. O percurso que extraímos do conjunto de ensaios aqui reunidos é significativo. Levanta de modo frontal não só a presença, mas também o movimento de negação sublimadora da força criativa da mulher no cinema. Mostra que a postura de ignorância não pode mais se sustentar. Reflete a dificuldade de aceitar as especificidades de gênero e o fato de que a própria obliteração do recorte excludente é uma discriminação. Então, quando os portões se abrem e o fundo da sala é clareado, insuspeitas criaturas vêm à tona em atitude de poder, com suas imagens, seus filmes, as diversas facetas diferenciadas, sensações e percepções próprias. Ao colocarmos o dedo na ferida do gênero, ainda mais dilatada quando atravessada pela questão racial, não é necessário esquecer outros continentes da alteridade, como a questão de classe, que certamente a ele vem se agregar. Antes dissimuladas, agora políticas de exclusão e preconceito tornam-se evidentes, orientando para um só lado a recepção, ainda que involuntária, da realidade que nos cerca. O principal mérito do livro é, nesse sentido, evidenciar o reiterado desvio de rota, a banalidade do mal que cerca o "ver ignorando", a negação ao acesso.