Dostoiévski diz, por meio de um dos personagens de Os irmãos Karamazov: “Somos assim: sonhamos o voo, mas tememos a altura. Para voar é preciso ter coragem para enfrentar o terror do vazio. Porque é só no vazio que o voo acontece. O vazio é o espaço da liberdade, a ausência de certezas. Mas isso é o que tememos: o não ter certezas”.A leitura do livro de Cecil Rezze testemunha a verdade desse pensamento. Encontramos nele questões e relações importantes entre conceitos fundantes, invariantes, que permitem reconhecer que estamos em área psicanalítica, ao mesmo tempo em que rompem a mesmice do já consagrado, provocando insaturação num campo sempre em perigo de sofrer calcificações. Surgem daí propostas como a das frestas necessárias ao trabalho em áreas de não pensamento, o valor de teorias fracas na clínica, os fantasmas como recurso para aproximação ao não conhecido... São ideias valiosas na medida em que, provindo da clínica, evocam nosso trabalho cotidiano.