Indígenas de uma região norte do Brasil entregam os seus cartões bancários, por meio dos quais têm acesso a benefícios sociais, tais como o Bolsa Família, para comerciantes locais não-indígenas. Alguns deles, de posse de dezenas de cartões simultaneamente, parecem dispor dos recursos de modo escuso, trapaceando os indígenas ao escamotear os preços dos bens adquiridos em suas lojas e enviados às aldeias. Supreendentemente, as supostas vítimas, em seus depoimentos, insistem na adequação desses arranjos comerciais. O estudo detalhado das ações judiciais movidas a partir desses casos, com foco nos depoimentos de indígenas e comerciantes, é o ponto de partida de Daniel Dalberto para um amplo exame histórico e antropológico das relações entre indígenas e brancos no Brasil. Com grande erudição, o autor passa do contexto da invasão europeia aos persistentes preconceitos contra os povos indígenas, levando o leitor a compreender as peculiaridades de seus sistemas econômico e universos relacionais, que valorizam as relações interpessoais baseadas na confiança, como aquelas que mantêm com os comerciantes. Aparecida Vilaça Professora titular do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/UFRJ