Ursos polares costumam ser um exemplo de paciência. Obstinados, são capazes de passar horas a fio à espreita de uma presa - em geral, uma foca desavisada -, em lugares muito frios e brancos. Uma rotina um bocado monótona, como podemos imaginar. O peludo que aparece na nova história da escritora Mathilda Kóvak, porém, é diferente. Afinal, ele não é meramente polar; é bipolar. Paciência não é com ele. Em vez de ficar quieto, gosta de revezar seu tempo entre o Polo Norte e o Polo Sul. É, vê-se, um animal de extremos - nem cogita uma paradinha na altura do Equador. Tanto destrambelho geográfico acaba fazendo com que perca o equilíbrio e, literalmente, caia numa roubada. É a partir daí que começa uma divertida odisseia por paisagens que nem de longe lembram a vida nos polos. O urso bipolar usa uma palavra tão em moda no vocabulário de transtornos contemporâneos como mote para uma história cheia de humor e inteligência. Distante da rotina entre os extremos, o herói peludo experimenta as novas aventuras com certa melancolia. Perturba-se. Sente saudade de seu habitat natural e do antigo - e instável - dia a dia. Recorre à corda bamba para tentar voltar aos velhos tempos. É surpreendido por algumas reviravoltas e, ao se deixar levar pelo sabor do acaso, acaba enfim encontrando certo equilíbrio. Mais uma vez, Mathilda Kóvak mostra porque é uma das mais originais autoras de livros infanto-juvenis em atuação no Brasil hoje. Seu O urso bipolar apresenta uma trama criativa como poucas - um indisfarçável libelo contra a mesmice. Com candura e delicadeza, a autora lança-se a uma espécie de alegre subversão. Com isso, cria tipos inesquecíveis - caso deste adorável urso bipolar. As ilustrações de Mario Bag atribuem ainda mais carisma à história, ao revelarem, em páginas exuberantes, os detalhes hilários desse universo doidivanas que é, afinal, muito parecido com o de todos nós. E o livro ainda vem com um brinde; a imagem de uma máscara de urso, para ser escaneada e montada.