O concurso público é uma ferramenta da gestão de pessoas do Es­tado responsável pela captação de talentos, que foi evoluindo nos âmbitos jurídico e administrativo, e está impactando em uma trans­formação cultural, verificada por meio da mudança de sonhos, hábi­tos e valores de uma quantidade cada vez maior de pessoas. Uma indústria cultural. Os concurseiros apresentam uma padronização dos hábitos de es­tudos e descanso, e das crenças sobre trabalho e concurso. Possuem sentimentos como inutilidade, dependência e baixa autoestima, característicos do sofrimento dos desempregados identificados na literatura científica; mas também sobrecarga e pressão por desem­penho pelo nível de exigência dos concursos. Eles relataram estra­tégias como autoaceleração, racionalização, negação do sofrimen­to, automedicação (doping), e a psicodinâmica do não-trabalho, que viriliza o concurseiro e ameniza o sofrimento do desemprego. Uma nova cultura, fruto das modernas formas de organização do trabalho e das conjunturas sócio-políticas, em especial na capital do país, produzindo em larga escala esse personagem idealizado pela organização do trabalho no serviço público, e alienado do trabalho real. O processo de seleção do concurso torna-se um fetiche dessa cultura, um fim em si mesmo. Conclui-se que a ideologia defensiva frente ao sofrimento pelo de­semprego contribui para a sacralização da seleção para o serviço público, legitimando a cultura do concurso.