Em Primeiro como tragédia, depois como farsa analogia à famosa frase de Karl Marx em O dezoito brumário sobre a repetição dos Bonaparte no poder (Napoleão e Luís) , o filósofo esloveno Slavoj iek sustenta a tese de que vivemos em uma nova etapa do capitalismo global, na qual o mesmo discurso que garantiu uma ofensiva geopolítica após os atentados de 11 de setembro tem encontrado dificuldade em se sustentar no período pós-crise financeira de 2008. Traçando uma argumentação tanto da tragédia como da atual farsa, o autor expõe o cinismo contemporâneo dos pregadores e praticantes da democracia liberal ao analisar o discurso do presidente Bush em dois momentos diferentes que evocam a suspensão parcial dos valores norte-americanos (garantia de liberdade individual, capitalismo de mercado) para salvar da falência esses mesmos valores. A iek parece, portanto, que a utopia democrático-liberal teve de morrer duas vezes, já que o colapso da utopia política do 11 de Setembro não trouxe o fim da utopia econômica do capitalismo de mercado global, o que só ocorreu com a crise financeira de 2008. Para o autor, o mais atual anacronismo vivido pelas nações modernas teve início com a queda do Muro de Berlim, evento histórico que parecia anunciar a vitória da democracia liberal e o surgimento de uma comunidade global sem fronteiras. O 11 de Setembro, no entanto, revelou um movimento oposto com o surgimento de novos muros e contradições: entre Israel e Cisjordânia, em torno da União Europeia, na fronteira entre Estados Unidos e México e até no interior de Estados-nações, que acolhem cidadãos globais que vivem isolados em castelos na Escócia, apartamento em Manhattan e ilha particular no Caribe, além dos moradores das favelas e bolsões de pobreza, que são o outro lado da mesma moeda. As condições e conseqüências da crise em curso são abordadas em uma análise que se auto-afirma engajada. Dividido em dois capítulos, o livro faz um diagnóstico do âmago utópico da ideologia capitalista e busca localizar aspectos dessa difícil situação que abrem espaço para novas formas de práxis comunista. A única maneira de compreender a verdadeira novidade do novo é analisar o mundo pela lente do que era ‘eterno’ no velho, afirma Zizek.Tomando a idéia de comunismo como eterna não no sentido de uma série de características universais e abstratas que podem ser aplicadas em toda parte, mas no sentido de que deve ser reinventada a cada nova situação histórica, Zizek propõe uma mudança de perspectiva, que questione a situação atual do ponto de vista da idéia emancipadora e não mais a pertinência desta como ferramenta de análise e prática política.