Tomando como referência os contextos situados nos quais essas relações incertas entre o legal e ilegal se processam, queríamos perscrutar os agenciamentos políticos postos em ação nesses lugares, seus pontos de fricção, os campos de tensão e conflito que vem se estruturando nesses terrenos incertos da vida urbana. Se as fronteiras do legal e ilegal se deslocam, isso significa não tomar como ponto de partida tipificações jurídicas e definições estabelecidas no âmbito do ordenamento estatal. É pelo ângulo das práticas, em contextos situados, que a questão se coloca. O fato é que pessoas, bens e mercadorias transitam de um lado a outro dessas fronteiras, e essas mobilidades laterais são o que propriamente assinalam a porosidade dessas fronteiras e o deslocamento constante de suas delimitações:ao longo de seus percursos, pessoas e bens podem ser legais em um momento, ilegais em outros, conforme as circunstâncias, os arranjos vigentes em cada momento, os códigos normativos cambiantes em diferentes contextos sociopolíticos ou conforme os espaços nacionais em que se encontram. Nossa preocupação foi justamente entender como se dão essas passagens, averiguar como elas se produzem, o jogo dos atores e os arranjos contextuais nos quais os limites legais são contornados ou então são negociados os modos de aplicação (ou não aplicação) da lei e códigos formais, seja no que se refere à circulação e transação de mercadorias nos mercados locais, seja no que se refere às formas de trabalho ou dispositivos de sobrevivência, ou seja ainda no que se refere ao acesso à terra e moradia.