A nota acesa na ponta em brasa sumia no apartamento e em nosso silêncio aquela nota eu não poderia esconder minha voz não soava em nenhum acorde Eram permitidas as frases que não morressem queimadas: o que agride o corpo, vive o corpo Desistimos um pouco quando acendemos esse cigarro quando emito uma nota dissonante Em 1996, Wislawa Szymborska recebeu o Nobel da Literatura. No discurso de premiação, a polonesa falou sobre o trabalho dos poetas como um processo aparentemente não fotogênico. Szymborska nos convida a imaginar a cena de um documentário que tem como personagem principal alguém que escreve poemas. Uma pessoa caminha pela casa. Senta-se numa mesa. Durante vários minutos, olha o papel. Depois de um tempo, escreve alguns versos e logo apaga o que escreveu. Volta a caminhar pelos cômodos, retira um livro da estante. Retorna para sua mesa de trabalho ou deita-se no sofá, onde permanece observando as sombras projetadas na parede. Aparentemente nada acontece.