Qual o alcance da anulação de um acto administrativo, sobretudo quando entretanto muito tempo passou e muita coisa pode ter acontecido que, em maior ou menor medida, dificulta a reconstituição da situação que deveria existir se o acto ilegal nunca tivesse sido praticado ? Em que moldes se deve proceder ao restabelecimento da situação actual hipotética, nomeadamente no domínio da reconstituição da carreira de funcionários públicos e no que se refere ao dever de pagar os vencimentos que estes teriam auferido na ausência do acto ilegal? Como interpretar o regime dos actos consequentes de actos anulados e resolver as complexas questões que se colocam a propósito do destino destes actos? Como interpretar o regime do artigo 128.°, n.° l, alínea b), do Código do Procedimento Administrativo a respeito da eficácia temporal dos actos que são praticados após a anulação de um acto administrativo e, em particular, que resposta dar à delicada questão de saber se (ou em que medida) os actos administrativos anulados podem ser renovados com eficácia retroactiva ? Como enquadrar o fenómeno da renovação de actos administrativos anulados e articular o poder de renovar com o dever de reconstituir a situação que existia sem o acto anulado? Qual o regime jurídico aplicável aos actos administrativos que deviam ter sido praticados em determinado momento, mas foram ilegalmente omitidos ou recusados, se entretanto tiverem surgido novas normas (em particular, novos instrumentos urbanísticos) que não teriam sido aplicáveis se aqueles actos tivessem sido praticados no momento devido? Que enquadramento dar à indemnização devida quando já não é possível extrair consequências da anulação de um acto administrativo? Estas são algumas das questões analisadas no trabalho que agora se publica e que, com diversas adaptações, corresponde à dissertação de doutoramento em Ciências Jurídico-Políticas (Direito Administrativo) apresentada, sob o título "Anulação contenciosa de actos administrativos e relações jurídicas daí emergentes", na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, sob a orientação do Professor Doutor Diogo Freitas do Amaral. A dissertação foi concluída em Março de 2000 e discutida em provas públicas, em Janeiro de 2001, perante um júri presidido pelo Reitor da Universidade Católica Portuguesa, Professor Doutor Manuel Braga da Cruz, e constituído pêlos Professores Doutores Armando Marques Guedes, Rogério Ehrhardt Soares, Diogo Freitas do Amaral, António Luciano de Sousa Franco, Jorge Miranda, Marcelo Rebelo de Sousa, José Manuel Sérvulo Correia, José Carlos Vieira de Andrade, Maria da Glória Dias Garcia, Manuel Afonso Vaz, Vasco Pereira da Silva e José Augusto Engrada Antunes. Foram arguentes o Professor Doutor Diogo Freitas do Amaral e o Professor Doutor José Manuel Sérvulo Correia. As adaptações foram, em grande medida, devidas à particular conjuntura em que a dissertação foi redigida e surge a público. Claramente situado num domínio de fronteira entre o direito administrativo (substantivo) e o direito processual administrativo, este trabalho foi concluído em plena discussão pública sobre a reforma do contencioso administrativo e vem a ser publicado no momento da concretização dessa reforma, que vem introduzir modificações de alcance muito significativo no nosso sistema de contencioso administrativo - para o efeito que aqui mais interessa, sobretudo no plano da configuração dos meios de acesso à justiça administrativa que são colocados à disposição dos particulares, seja no que se refere à possibilidade de pedir a condenação da Administração à prática de actos administrativos ilegalmente recusados ou omitidos, seja no que diz respeito à possibilidade de se cumularem, no processo de impugnação do acto, outras pretensões relacionadas com o pedido de anulação. É já à luz deste novo contencioso administrativo que são analisadas as questões neste trabalho. Sem prejuízo de documentar, naturalmente, um momento do percurso académico do seu Autor, assim se procura assegurar, numa perspectiva mais ampla, que a presente publicação desempenhe a função, que também lhe cabe, de fornecer à comunidade jurídica um instrumento tão útil quanto possível de análise das complexas questões que, nestes domínios, se colocam.