As Horas Podres, de Jerônimo Teixeira, apresenta duas narrativas que correm em paralelo: o tenso diálogo entre tio e sobrinho se entrelaça com as amargas memórias da adolescência de um homem que retorna, na ocasião do enterro da mãe, à pacata cidade natal, Estância Velha, e se lança em reflexões acerca da vida, do passado e da própria escrita. Pensamentos esses que explicam o peso e o odor nauseante do texto, o mesmo cheiro pútrido da indústria coureira que empesta cidade. Ao lado da poluição moral e atmosférica, a cegueira e a escuridão também são imagens recorrentes do livro. No romance, um homem é acusado de assassinar uma enfermeira e o próprio pai. Todas as evidências - além das suas digitais nas armas, alguns vizinhos alegam tê-lo visto na região logo após os disparos - apontam para ele, que acaba por assumir o parricídio. Assim, procura o tio para contar a sua história e tentar se justificar, confessando que não sente orgulho pelo que fez, mas também não tem vergonha do crime. Conforme o diálogo entre ambos vai avançando noite adentro, conflitos, mentiras e segredos de família vão sendo revelados. Além de abordar a delicada relação familiar, com referências ao mito de Édipo, o livro também recupera um crime ocorrido no sul do país que ocupou as principais páginas policiais por alguns meses e jamais foi resolvido. Em 1995, em Estância Velha, os olhos do agricultor Olívio Correia foram roubados inexplicavelmente. "Na estrada, o carro pára. Oferece carona. E o agricultor só é encontrado no dia seguinte, na beira da estrada. Ao seu lado, no embrulho, junto com a carne de segunda, seus olhos arrancados. Mas, claro, vocês já conhecem essa história." Uma história amplamente divulgada e relembrada por cinco ou seis meses, dando origem a versões contraditórias e delirantes, teorias que envolviam urubus e transplante de órgãos, até que a suspeita de uma seita satânica ganhou força nos jornais e o caso foi silenciado após ser apontada uma possível participação do prefeito da cidade.