A história do Direito Penal foi fundamentada no protagonismo do poder punitivo, considerado como elemento inserido, por séculos, em uma relação de sinonímia com a justiça. Nesse panorama, verificamos a transição das fases de vingança divina e privada, em direção ao período da vingança pública, que autorizava a aplicação de suplícios e torturas. Esse foi o contexto propício à edificação da proposta da privação da liberdade como categoria punitiva autônoma, resultando, posteriormente, em alternativa prejudicial no âmbito dos programas punitivos. Nessa conjuntura, torna-se exigível a reconstrução da dogmática e das práticas penais. Essa necessidade é consubstanciada na garantia de realização dos fins principais da ciência da ultima ratio, bem como na proteção dos direitos previstos no Texto Constitucional, erigidos à condição de normas-princípios. A proposta que apresentamos surge como projeto de revitalização de práticas antigas, a partir da reparação dos danos suportados pela vítima do delito. Para cumprimento desse objetivo, recorremos aos procedimentos participativos, envolvendo a comunidade de próximos, no sentido de satisfação das finalidades legítimas das respostas jurídico-penais, realizadas pela reinserção social do infrator, bem como, pela restauração da confiabilidade normativa. Esses mecanismos são concebidos como instrumentos destinados à missão última do Direito Penal, materializada na paz social. Nesse aspecto, os programas de Justiça Restaurativa, em suas diversas modalidades, serão dirigidos à elaboração de uma concepção realizável da justiça criminal, reinterpretada, a partir da perspectiva da pacificação dos conflitos sociais. Concentramos especial atenção aos delitos de natureza culposa, decorrentes da inobservância do dever de cautela, diante do comportamento direcionado à realização de riscos, inicialmente, permitidos, por considerarmos a inefetividade e a inadequação das respostas penais tradicionais para crimes dessa modalidade.