A cidade devastada de Ithalo Furtado está abarrotada de uma perturbação que parece nunca evaporar. Abarrotada das ruínas, das memórias, de um passado que insiste em estar ali. E é suposto que seja dita, aqui, dessa maneira: porque precisamos da poesia que fale da dor sem moderação. Que levante a camisa para mostrar a pele rasgada para desconhecidos. Que mostre a fratura exposta das estranhezas do eu com o mundo. Que fure a película do decoro com o odor de mijo, os vícios, as denúncias, a solidão, as caras dos afetos que poucos têm coragem de dar a tapa. Que seja, enfim, inerente ao humano. Porque é preciso coragem esse milagre em tempos tão bárbaros, pandêmicos, genocídicos para trabalhar a dor, manipulando-a sobre o cansaço das mãos. Manipular um produto tão hiperativo, cheio de ânsia, em poesia: é preciso coragem, e ela é visível no trabalho da linguagem poética de Ithalo, que constrói, em terreno tão vulnerável e tão árido, imagens sólidas, maciças, inteiras. [...]