Um poema pode nascer do fortuito: espanto, vertigem, a fratura que se instala, provocada por uma mínima alteração na densidade dos ventos, o pálido sentido que resgatamos do absurdo, aquilo que se vislumbrou ou que se ocultou no instante de sua criação. E há poetas que colecionam poemas assim, um após o outro, até que a unidade do pensamento corresponda a um fato biográfico: o registro de uma idade, de uma crise, de um ponto de transcendência, de um sangramento que não pode ser estancado se não o primeiro morto, aquele que carrega um significado que o ultrapassa. Vários mortos habitando um único corpo. Vários e tortos renascimentos. Eis aqui o maior sentido e virtude de Eu não consigo parar de morrer, de Camila Assad. Trata-se de um livro enquanto percurso, ou melhor, enquanto parte de um percurso. Logo, trata-se de um livro atravessado por um tempo que chega sem revelar o seu sentido, mas que aqui está, manifestando-se nas notícias dos jornais, na realidade física do corpo,[...]