O Diário da Felicidade, do monge ortodoxo romeno Nicolae Steinhardt (1912-1989), obra-prima da literatura romena, vinda a público em 1991, reúne em si tantos gêneros literários, que só a humildade do autor, aliada à sua profunda argúcia, poderia chamá-lo diário, e mais ainda da felicidade. Momento central do livro é a conversão de Steinhardt, judeu de nascimento, ao cristianismo ortodoxo, através do batismo, realizado numa cela fétida e nas condições mais precárias das muitas prisões com grades e de consciência que o regime comunista, totalitário e sangrento, impõe a todos os que com ele não concordam. Desse momento central, em flashes que vão ora para o futuro, ora para o passado, o autor faz retratos psicológicos de pessoas, interpreta passagens bíblicas, analisa trechos famosos da literatura ocidental, passa em revista as condições para ser cristão, concluindo que a principal delas é a coragem, mostra os estragos físicos e morais que o comunismo cometeu, e, em resumo, prova que o indivíduo, entregando-se a Nosso Senhor Jesus Cristo, é capaz de transcender o tempo e o sofrimento, chamando de felizes, interiormente, os momentos mais cruéis a que foi submetido em sua vida. Elpídio Mário Dantas Fonseca "Entrei cego na prisão (com vagos fulgores de luz, não acerca da realidade, mas interiores, fulgores autógenos de trevas, que fendem a escuridão sem dispersá-la) e saio com os olhos abertos; entrei mimado, luxento, saio curado de caprichos, afetações, presunções; entrei insatisfeito, saio conhecendo a felicidade; entrei nervoso, impaciente, ultrassensível a bobagens, saio sereno; o sol e a vida diziam-me pouco, agora sei apreciar o menor pedacinho de pão; saio admirando mais do que tudo a coragem, a dignidade, a honra, o heroísmo; saio reconciliado: com aqueles com quem errei, com os meus amigos e inimigos, e, ora!: comigo mesmo." Nicolae Steinhardt