Paulo Hesse foi um dos protagonistas de "Cabeça de Papel", primeiro romance de Paulo Francis. Pegue qualquer resenha do período: Paulo Hesse é sempre identificado como um alterego de Paulo Francis. Era assim que a gente lia seus romances: em busca de pistas sobre o autor. O personagem autor encobria os personagens dos romances. A figura de um ofuscava as dos outros. "Carne Viva" é o último romance de Paulo Francis. Nele, Paulo Hesse surge apenas por um instante. O banqueiro Francisco Guerra o reconhece em Paris, na Place Vendôme, em meio aos protestos de 1968. Ele está de costas, afastando-se. Francisco Guerra comenta: "Olha ali, olha só! É Paulo Hesse, o jornalista. (...) Lá vai ele se unir aos garotos e ajudar a queimar a cidade".Paulo Francis morreu em 1997. Ele tinha acabado de escrever um romance. Este aqui: "Carne Viva". Na época, seu editor sugeriu uns ajustes. Era o que ele pretendia fazer quando, como Paulo Hesse, deu as costas e se afastou. "Carne Viva" permaneceu dez anos na gaveta, exatamente como Paulo Francis o deixara. Até o dia em que Sonia Nolasco, sua mulher, o releu. E, para a nossa sorte, resolveu publicá-lo. De certa forma, "Carne Viva" é premonitório. É o relato de um Brasil sem Paulo Hesse e sem Paulo Francis. Em seus romances anteriores, o Brasil provinciano era contaminado - e era ridicularizado - pelo acontecia lá fora.