As vinte e quatro cartas escritas por Miss May Frances para uma amiga de sua Inglaterra natal, entre 1887 e 1888, possuem valor inestimável. Escreveu-as da Fronteira, na vizinhança de Uruguaiana, mais precisamente de um rancho coberto de capim, nas cercanias do Rio Touro Passo. Tal valor, contudo, não viria da descrição cinematográfica que fez, com momentos de suspense e glória, da construção da BGS, a Brazilian Great Southern, a ferrovia que ligava o Rio Quaraí (desde Barra do Quaraí) a Itaqui, já em 1888. Seu irmão Geoffrey a quem veio fazer companhia no rancho mencionado participou da construção da BGS como engenheiro-chefe. Tal valor, igualmente, não viria do inspiradíssimo registro que fez da natureza, do pampa, de sua flora e fauna, da amplidão de nossos horizontes, de nossos céus, dos esplendorosos crepúsculos sanguíneos, dos luares, das noites profundas da Fronteira, salpicadas de poeira de diamante, quando sua pena chega a momentos de sentida poesia, que expressam o amor que dedicou a essa paisagem amplíssima, libérrima, onde sentia perfeitamente que estávamos sobre uma dessas esferas que povoam o universo infinito. O grande valor das cartas de Miss Frances vem do fato de que seus comentários e observações desvendam a estrutura da mente hegemônica, ou seja, como os países hegemônicos, ontem e hoje, constroem uma ideologia que justifica o domínio que têm sobre países, povos, nações etc. Por isso, a introdução a esta tradução versa sobre A mente hegemônica de Miss Frances. Auxiliado pelas ilustrações da época da jovem inglesa, Fernando Cacciatore de Garcia desvenda os mecanismos que fazem com que os colonizados aceitem os padrões mentais dos colonizadores. Nesse processo, entre outros instrumentos analíticos, valeu-se da identificação com o opressor, glosando Freud. Por ser uma análise original da mente brasileira, essa introdução toca pontos polêmicos diante de todas as formas de história tidas como válidas no Brasil.