Migração dos Cisnes é um fascinante romance multicultural, ambientado na Europa, com uma engenhosa narrativa organizada como uma perfeita sinfonia. Trata-se, certamente, da obra-prima de ficção de um esmerado artesão da palavra, Ricardo Daunt, autor que se recusa a tornar seu ofício um exercício de mediocridade. Por isso, serve ao leitor um biscoito fino de sabor talvez inicialmente estranho a paladares pouco sofisticados. Mas que se revela uma excepcional iguaria aos que se entregam ao banquete da inteligência e da sensibilidade.
Como numa composição sinfônica, Ricardo Daunt adota nesta obra rara diversas estratégias de narração, ora alternando a técnica, o ritmo, a perspectiva; ora retardando ou acelerando a ação, intensificando o pormenor; ora ainda em voo amplo e aéreo; ora produzindo com excepcional domínio verbal e rara felicidade o universo do sonho; ora capturando cinematicamente o ir e vir dos protagonistas em suas cidades, em seu trabalho, em suas relações.
Romance introspectivo? De suspense? De ação? A obra é tudo isso captado no curso de três dias da vida dos protagonistas. Três dias que antecedem o início de O jogo de Dublin, engendrado por Joe, ou Gepeto, um aposentado funcionário de uma empresa de navegação, que resolve surpreender o mundo com uma descoberta literária que envolve James Joyce. Para levar a cabo o intento, organiza o jogo e escolhe aleatoriamente seus participantes.
Há uma promessa de prêmio ao vencedor. O português Manoel e o francês Lucien concordam em participar. Joe é auxiliado pela filha Kathleen, que vive em Paris e segue furtivamente os jogadores.
A primeira parte da obra passa-se entre Lisboa e Paris. A segunda, na Irlanda, num tempo quase mágico, embalado pela experiência do sonho e por uma realidade em transe.