Se nos textos de Maquiavel a política aparece à meia luz, é porque a fez descer à caverna, que na conhecida imagem de Platão representa o mundo, os claros e distintos conceitos que permaneceram até então impolutos por cuidadoso apartamento do território do demagogo e do sofista, justamente onde os homens vivem suas relações de poder. Platão e Aristóteles, Santo Agostinho e Santo Tomás compartilham o ânimo de proteger o pensamento político do "mundo da vida". A originalidade de sua obra revela-se pela exigência de síntese sempre imperfeita. Com mais nitidez no Príncipe que nos Discursos, os livros de Maquiavel apresentam a notável singularidade de constituírem as únicas análises de situação concreta levadas à dignidade de tratados de filosofia política. Ao contrário dos pósteros, seus textos não buscam refundar o pensamento a partir de idéias claras e distintas e desdobradas pela dedução. Submete, antes de tudo, um conjunto de saberes que estatuem postulados universais ou mais freqüentes, ou mais aceitos, simplesmente, aos juízos e ditames da razão prática, a saber, aqueles orientados pelo "bem comum" e para a ação política.