Todo grande ficcionista tem uma visão de mundo a irrigar sua obra. Raras vezes, porém, tal visão de mundo é fixada em uma reflexão pública, duradoura e fundamental. "A simples arte de matar", célebre ensaio publicado em 1944, é desses raros casos. Nessa verdadeira profissão de fé, Raymond Chandler (1888-1959), o já estabelecido escritor noir, tece reflexões acerca do ofício de escrever histórias de detetive. Se por um lado seu mestre é Dashiell Hammett, ele explica por que é tão difícil escrever um conto de detetive perfeito. Elabora sobre os tipos de histórias do gênero, sobre o questionamento de serem ou não arte - e até mesmo sobre o que é arte, simplesmente. Reforça a crença no gênio criador ("Tudo que é escrito com vitalidade exprime essa vitalidade: não há sujeitos desinteressantes. O que há são mentes desinteressantes.") e elucubra sobre a natureza da leitura ("... toda e qualquer leitura por prazer é uma fuga") em detrimento de preconceitos literários - preconceitos que durante tanto tempo relegaram as histórias de detetives a uma esfera inferior. Finalmente, esboça sua opinião de como deve ser um detetive, que se aplica não só, mas sobretudo, ao seu principal personagem, Philip Marlowe: "Se houvesse outros como ele, o mundo seria um lugar mais seguro para se viver, sem que com isso se tornasse desinteressante a ponto de não valer a pena viver nele". Este volume, fundamental para todo leitor de histórias policiais, conta ainda com "Sangue espanhol" (1935), "O rei de amarelo" (1938), "Vou estar esperando" (1939) e "Pérolas são um incômodo" (1939), ótimos exemplos do grau de apuro literário que o autor conseguira já nos seus primeiros contos.