Por que arte no meio da fome? "É claro que o mundo é cheio de beleza, até quem não vê, escuta. O problema que poderá te derrubar por dois segundos seria que no meio de tanta beleza ... há uma coisa chamada "O que é feio". Essa coisa é como um senhor circunspecto, e do meio, e do meio de seus olhos de lampião emana toda a gravidade do mundo. De início diríamos a ele: não é preciso perseverar tanto em vosso amor conosco: dai-no-lo como quem dá um suspiro ao ver o copo d´água com que matará em dois segundos a sede por dez dias. Mas: queremos silêncio. Sim, a beleza também é verdadeiramente silêncio, mas vossa presença aumenta o tom deste silêncio, tornando-o indescritível. Vossa presença é o silêncio estável do mundo. Como há riquezas, pessoas sãs, fantasia, carnaval! Como há pobrezas, pessoas insanas, realidade, quarta-feira de cinzas! O que é feito não precisa se chegar com força a nós: já o admiramos e, o que é mais importante ainda, consideramos. Ainda: o teremos. E com esta última vez podemos continuar no tênue fio que é preferível chamar-se de Amor. Além disso é preciso arte. A Arte é a senhora do tempo. A arte é a cigarra no alto de um formigueiro. A arte é o profeta Isaías dançando com Maomé. A arte é o palhaço aceso a rir dos tempos de circo, meu caro idólatra do hoje-é-hoje. O gesto de arte precisa ser construído como casa, porque o gesto de arte é o maior amor que um ser humano dá à humanidade. Não, arte não é filantropia, senhor que supõe imaginar na cabeça na cabeça do iceberg o seu corpão. Arte é processo longo artista-receptor, de cuja dualidade nasce o uno do eterno. Jogue-se fora o excesso de sorrisos loucos, "simpáticos". Morra o pânico. Precisa-se de discrição no mundo. Construa-se no silêncio, porque é claro que o mundo tem jeito. Ele não depende de você. Nem de mim. Ele depende das pessoas, que cheiram a arte. Nosso Amor é o mundo e o céu rico pobre belo feio triste feliz e lavoura de trigo, verde, trabalhai."