O sistema penal, enquanto um sistema de controle social, afirma a sua legitimidade ao abrir o seu sistema científico para uma valoração político-criminal que carrega a identidade cultural da sociedade a qual se vincula. Essa abertura é obtida com a relevância que a dogmática penal atribui à autonomia do titular do bem jurídico no âmbito de determinação da proibição penal necessária à proteção de bens essenciais ao ser humano em sociedade. O objetivo desse estudo, assim, é analisar o comportamento do titular do bem jurídico como critério de imputação objetiva do resultado ao agente, orientando uma compreensão material da proibição penal, nos casos em que tal titular interage com este na composição do fato social que ultrapassa os limites do risco permitido ao perigo proibido nas relações de trânsito. Justifica-se, para além da atualidade, por analisar um tema que se insere na pauta social que demanda um Estado material de Direito, ou seja, capaz de orientar construções dogmáticas sobre a teoria do delito hábeis à compreensão da autonomia enquanto fundamento material à expansão dos espaços de liberdade no sistema social. O estudo tem como objeto a problematização dos fatos sociais arriscados, que são incorporados pelo sistema social como adequados ou até necessários ao seu desenvolvimento, no qual se destacam os riscos no trânsito, e a adequação do sistema penal, enquanto sistema de controle social institucionalizado em que se subleva a importância da dogmática penal para tutelar tais riscos sociais, mas com respeito à autonomia individual. A pesquisa utiliza o método dedutivo, partindo da compreensão universal do objeto, num viés teórico e fático, com o levantamento jurisprudencial de um grupo de casos especiais, para identificação de circunstâncias específicas que orientem a proposição de mudanças paradigmáticas no procedimento de avaliação da autonomia contido nas construções dogmáticas sobre a teoria do delito.