As reflexões propostas no livro não fornecem um arsenal teórico psicológico dirigido para a favela tal como foi outrora dirigido para a doença mental, para os problemas do trabalho ou da educação. É a própria objetividade psicológica que é questionada. Diferentemente, um movimento primordial anima este texto, um movimento que opera uma inversão de perspectiva. E o faz de maneira provocativa: em lugar de produzir uma psicologia da favela, proclama a produção de uma psicologia favelada. Mariana narra como seu percurso na formação em Psicologia, aliada tanto à pesquisa como ao trabalho no territo´rio, a levou a identificar que alguns pressupostos difundidos entre as teorias psicológicas e difusamente presentes nas aulas dos curso de graduação se articulam com certa perspectiva elitista e produzem em seu desdobramento profissionalizante uma elite intelectual e profissional cujas ações precisavam ser analisadas para que esta inversão fosse produzida. Três caminhos foram explorados neste livro. O primeiro se vale da inversão mencionada para analisar o plano da formação, da ordenação conceitual e do exercício da profissão. A análise dos projetos comunitários da psicologia, de sua história e de seus investimentos delineia um cenário de amplas capturas e algumas insurgências. Se o projeto comunitário parece ao leitor desavisado ou ao estudante ávido de participação social a garantia de uma ação humanizante da psicologia, descobrimos capturas conceituais sobre o termo comunidade que mantém o especialismo e o individualismo. Descobrimos algumas lutas pelo domínio acadêmico da, assim chamada, etiqueta Psicologia comunitária. As análises sobre o projeto comunitário, sobre a noção de comunidade, sobre a prática profissional voltada à transformação social e sobre a própria Psicologia Comunitária nos mostram onde encontrar a luta que importa.