Pensar a literatura brasileira contemporânea, cada vez mais, significa expandir nossa perspectiva para além das fronteiras do livro publicado pelas grandes editoras, premiado, divulgado em jornais, depois traduzido no exterior. Para compreender um fenômeno tão vivo e fértil porque ferramenta e desejo de expressão, é preciso estarmos atentos a outras vozes, outros corpos, que percorrem outros espaços sociais. E, uma vez que o olhar não dobra esquina, como lembrava Ernst Gombrich (1995 [1959], p. 264), a crítica literária tem de se deslocar de seu lugar, sair dos gabinetes e ensaiar outros passos, para longe do conhecido e do repisado. Temos que dobrar a esquina para ver o que nossos olhos não alcançam, perseguir pelas calçadas e becos uma outra narrativa, um outro Brasil (descompensado, despreparado, violento, mas também alegre e esperançoso). É essa perspectiva que buscamos oferecer aqui, com a aproximação de dois termos que nem sempre andaram juntos: literatura e periferias. Refletir sobre a literatura brasileira contemporânea a partir desse ângulo é um caminho produtivo e mobilizador. Produtivo porque amplia consideravelmente o campo de visão que temos sobre a literatura e sobre a cultura brasileira. Mobilizador porque implica um rearranjo radical da prática e do lugar da crítica literária hoje.