Nos momentos decisivos da II Guerra Mundial, Carlos Drummond de Andrade escreveu poemas marcados pela figuração de questões por muitos consideradas "prosaicas". Foram os anos 1943-1945, quando o avanço nazi-fascista recebia duros golpes, sobretudo em território soviético. As sucessivas derrotas impostas pela Resistência ao Eixo Roma- Berlim-Tóquio revigoravam a participação mundial contra o universo de valores fascistas, marcado pela defesa raivosa da propriedade privada dos meios de produção e pelo combate a formas de governo participativo. Não há como negar que, em A rosa do povo, o seu fundamento artístico reside na pluralidade de temas e de formas, como também não se pode deixar de intuir que essa pluralidade vertiginosa serve a um projeto poético rigorosamente coeso. Qualquer descrição de aspectos estilísticos poderá criar categorias analítico-estruturais que, provisórias, resvalarão em equívoco ou precariedade, caso o necessário salto interpretativo desconsidere contextos os mais diversos, sobretudo o contexto imediato de produção e recepção dos poemas: 1943-1945 (bem como o contexto da própria obra, que são os poemas em si e nos diálogos evocados entre si ou com outros universos artísticos). Desse modo, a coletânea não se restringe a apenas mimetizar fragmentos da realidade na qual explicitamente se engaja, porque, ao contrário, em seus aspectos os mais diversos, íntimos ou exteriores, transfiguram-se significados e significantes costumeiros, através de uma potente, porque polissêmica e densa, linguagem poética. Mas nem por isso a transfiguração da univocidade reificada deverá, necessariamente, romper com o significado social do ato lingüístico, porque o que se percebe nas especificidades líricas da obra drummondiana de 1943-1945 é, ao contrário, a figuração de si própria como ato discursivo, marcando essa metalinguagem como resultado rigoroso de volição lírica.