'A tradição é a impossibilidade de dizer não. Jamais tive a liberdade de transgredir essa lei não escrita', escreve Leila nas primeiras páginas deste livro-depoimento. Aos vinte e um anos, Leila foi obrigada pelos pais a casar com um homem que ela jamais havia visto e de quem nunca ouvira falar. A história de Leila não é exceção nos dias de hoje. Somente na França, mais de 50 mil moças são vítimas de um casamento forçado. Leila, na verdade, chegou a transgredir algumas leis para a mulher muçulmana; fumou escondida, fugiu com as amigas, arrumou um trabalho noturno para não ter de ficar com a família. Mas a culpa não a deixou romper de vez com a tradição. Leila não foi vendida para seu 'marido', como algumas vezes acontece. 'Meu pai acredita na tradição dos casamentos arranjados entre famílias e é sincero em sua obstinação de me fazer obedecer, de me obrigar a ocupar meu lugar; ele não suportaria que sua filha vivesse de outra maneira', explica. Se ela contrariasse a vontade e ordem de seu pai, e dissesse não diante do juiz de paz, nem assim ficaria livre. Eles já estavam casados oficialmente no Marrocos e, embora esse casamento não seja reconhecido na França, para o pai dela e toda a comunidade do bairro ela estaria definitivamente 'condenada'. Seria considerada uma 'moça de má reputação'. Não poderia jamais retornar livremente ao Marrocos; o 'marido' dela teria o direito de procurá-la e, depois que a encontrasse, poderia repudiá-la.