Sempre o país viveu o racismo, e sempre houve formas de ocultação desse racismo no discurso oficial da cultura letrada. Quem só lê o Brasil pelos livros tem contato com essa face. A outra face, que assumiu o racismo mostrando o problema, não ficou escrita desde tão cedo. Mas também não se perdeu, simplesmente seguiu sem a escrita oficial para sobreviver. A cultura afro-brasileira veio se desenvolvendo e desdobrando e ganhou as ruas paulatinamente. E fornecem material de conhecimento a professores, jornalistas, músicos, atores, religiosos, cozinheiros, arquitetos, escritores, marqueteiros, médicos, advogados, terapeutas etc. Este enfoque é talvez inédito nos estudos de literatura e cultura popular, trazendo para a frente de análise personagens que a transmissão oral realça, mas que ficavam em segundo plano em diferentes registros nacionalistas da cultura brasileira, desde o Romantismo e o Modernismo. Aqui a comparação com Macunaíma se aproveita de maneira duplamente produtiva: melhorando o estudo daqueles personagens ditos ´palhaços´ e revendo ´o herói sem nenhum caráter´ em sua gênese e presença literária, tão vitais. Pode-se dizer que o Macunaíma na literatura brasileira é exceção, mas nas danças dramáticas é regra, desde as intuições de Mário de Andrade.