"A verdade como instância de legitimação da arbitrariedade". A arqueologia das ideias dominantes no mundo ocidental, relativamente à tarefa de adjudicação da solução de litígios em torno de comportamentos tidos como graves - a atual infração penal, conforme a definição jurídica hegemônica -, revela-se em toda a sua plenitude nessa expressão do Professor Salah H. Khaled Jr., no livro cuja nova edição tenho a honra de prefaciar. A percepção do vínculo entre verdade, prova penal e inquisitorialidade significa um giro metodológico fundamental: o inquisitório se traduz em práticas de poder autoritário, poder que se justifica em si mesmo; quando a busca da verdade se acomoda em seu leito é porque não é mais de verdade que se trata, mas de distribuição de castigos, em arranjos sociais inconcebíveis nos moldes republicano e democrático. A proposta do autor é ambiciosa, por mais que negue. É possível afirmar, todavia, que a ambição aqui está respaldada no que há de melhor em termos de pesquisa, originalidade na abordagem e profundidade de fundamentação. Creio que a proposta teórica contida nessa obra de excelência, de autoria de um de nossos melhores processualistas penais, sem favor algum, tem toda condição para orientar novas práticas no campo da prova penal condizentes com o ideal de respeito aos direitos humanos. Em termos de prova penal é até possível discordar de alguns de seus pressupostos. Não há mais, todavia, como contornar A busca da verdade no processo penal: para além da ambição inquisitorial e não debater os seus argumentos. A leitura será prazerosa para todos, certamente como foi para mim, que tenho o privilégio imerecido de apresentá-la ao público. Geraldo Prado