Quando escutei as suas primeiras canções, havia uma autorização para revisitar o meu próprio idioma. O nosso português, o português de Moçambique, andava às voltas em busca de uma licença que libertasse o namoro clandestino entre a norma portuguesa e os idiomas indígenas de Moçambique. Essa luz verde, sabíamos todos, não nos chegaria por via de académicos ou de qualquer autoridade. A vida havia de nos trazer essa licença. Mas a “vida” é uma entidade demasiado cheia de tamanho. A música brasileira, essa costureira de diversidades, acabaria por entregar esse convite para a transgressiva mistura. As canções de Chico faziam esquecer o olhar severo dos que se apresentavam como donos da língua e agiam como pais da namorada. Mas acontecia bem mais do que isso: o idioma que era agora mais nosso deixava de ser mera função: era música, era dança, era um modo de sentir o divino.