Rubem Braga - Um cigano fazendeiro do ar, do jornalista e escritor Marco Antonio de Carvalho, segue a tendência contemporânea, não apenas brasileira, mas internacional, das biografias que se podem dizer profissionais. A expressão habitual para se referir a tais biografias, resultantes de um trabalho sistemático de coleta de informações, de organização e de redação, é "biografia definitiva". Não se pode, porém, afirmar a priori que qualquer coisa seja definitiva. Mas se pode, com certeza, afirmar que algo atingiu maturidade profissional. É o caso do gênero estabelecido da biografia contemporânea " ao mesmo tempo exaustiva, extensiva e bem escrita. O livro possui números portentosos: 267 entrevistas na preparação, dez anos para ser finalizado, 448 páginas " das quais vinte de bibliografia. Felizmente, não possui prefácio. Felizmente, porque assim o livro se inicia in medias res, "no meio da ação", para usar a expressão da teoria literária. E ação e literatura são, aqui, termos pertinentes: de um lado, porque a longa vida de Rubem Braga teve episódios como o da sua participação na Segunda Guerra, como correspondente (não por acaso, onde o livro começa, num episódio cinematográfico); de outro lado, porque o biografado não é outra coisa senão escritor. Assim como o xadrez é considerado muita ciência para ser um mero jogo, e jogo demais para ser uma ciência, a crônica é jornalismo demais para ser literatura, e muita literatura para ser somente jornalismo. Partindo desse gênero híbrido, ou melhor, ambivalente (cujo valor tem dois âmbitos), Rubem Braga firmou-se como o maior cronista do país, o criador da crônica moderna e, por fim, o homem que transformou a crônica, para além de sua ambivalência de origem, em literatura. Se suas crônicas são consideradas "líricas", sua vida foi romanesca. O livro percorre todo o século XX, desde a vinda da família Braga de Portugal até os anos 1990, acompanhando a história conturbada do século e as peripécias do jornalista, cronista e escritor que a segue de perto, da pequena Cachoeiro do Itapemirim para o mundo, passando por Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Recife, Porto Alegre, Paris e Havana, entre outras, pelos grandes eventos políticos e por não menores episódios amorosos. A grande vida do autor de pequenos grandes textos numa biografia grandiosa.