Para Jacques Rancière, a política não é uma atividade rotineira, tampouco uma prática corrente nos sistemas consensuais que caracterizam boa parte das sociedades contemporâneas. A política é rara, e só acontece verdadeiramente nos momentos em que uma parte dos que não têm parte rompe a lógica supostamente natural da dominação e faz ouvir como discurso o que antes só era ouvido como ruído. Publicado na França em 1995, o desentendimento é uma das obras mais importantes deste que é reconhecido como um dos grandes pensadores da atualidade. Partindo das definições do político em Platão e Aristóteles, reinterpretando as revoltas dos escravos na Antiguidade, distinguindo as noções de polícia e política, e analisando as implicações do ato de falar que estão na base das disputas sociais, o livro desemboca numa crítica aguda às pós-democracias midiáticas, nas quais o povo é apresentado sob a forma reduzida da estatística e da sondagem de opiniões. Contra esse estado de coisas, seu autor propõe o entendimento da comunidade política como comunidade de litígio. Obra de atualidade impressionante, ocupando um lugar seminal na trajetória de Rancière, o desentendimento tem agora nova edição no Brasil, inteiramente revista e anotada.