Ao ser lançada esta obra, em 1991, procurou-se justificar algumas tomadas de posição pelas previsões quanto à necessária revisão, através do século xxi, de princípios julgados essenciais e inabaláveis no decurso da idade moderna e da idade contemporânea. Porque o tempo terá posto a descoberto o fundo falacioso desses princípios. E terá dado a conhecer a colheita dolorosa, trágica, resultante da sementeira daqueles mesmos princípios. Referiu-se então que o homem deificado se desacreditara inteiramente. Em razão de repetidos insucessos, próprios de aprendizes de feiticeiros. Nos últimos anos, já entrado o século xxi, estes insucessos e aquele descrédito avolumaram-se mais ainda. Os povos, no seu desânimo, querem mesmo remover as mentiras convencionais acumuladas, sobretudo, através dos últimos duzentos anos, de cuja falsidade se vão apercebendo. Porque têm tomado consciência de que elas envolveram a servidão humana no manto enganador de uma utópica liberdade abstracta, destinada, afinal, a fazer esquecer a autenticidade das antigas liberdades, que importa restabelecer, a fim de prevenir o flagelo de uma desenfreada licença, que tudo e todos ameaça. Revolvendo os arquivos, meditando com alguma profundidade, descobrindo alguma coisa do muito que se tem procurado ocultar, elementos jovens, afastando-se da preparação meramente técnica, atraídos pela cultura integral, vão procurando, nos diversos países e latitudes, retomar a linha de continuidade das civilizações. E essa linha de continuidade aparta-os da tirania dogmática imposta pêlos cânones do positivismo. Semelhante reacção tem-se manifestado particularmente nos domínios da história e do direito. Por motivos compreensíveis. A história ensina que a própria natureza é incompatível com o imobilismo, mas também com as improvisações precipitadas. E os dramas contemporâneos despertaram os espíritos atentos para o absurdo de legislações que, alheadas do conflito eterno entre o bem e o mal, se mostram indiferentes aos aspectos qualitativos e elevaram a quantidade à cimeira do absoluto. Essa mesma reacção da juventude estudiosa me convenceu plenamente de que eram ajustadas as previsões que arrisquei há uma dúzia de anos. Tanto quanto, no plano humano, as previsões serão admissíveis, sempre cerceadas por múltiplos condicionais. O século xxi estará, pois, destinado a profundas revisões e alternativas de rumos, para as quais há-de oferecer valiosa contribuição a filosofia do direito. Na medida em que saiba manter inteira independência face aos caprichos e às arbitrariedades dos legisladores, assim como em relação a todas as fantasias conjunturais que desconheçam a natureza essencial do homem e o fundo cultural por ele acumulado atavés dos tempos. Convirá que essa necessária e primordial contribuição da filosofia do direito para as revisões que os condicionalismos impõem seja afirmada com clareza, em simplicidade de linguagem, acessível a quantos pretendam razoavelmente conhecer as vias adequadas a superar a actual crise da justiça.