Com o nome do profeta judeu, Samuel, e o sobrenome do arcebispo inglês e santo católico, Becket, reforçado por um t, o irlandês Samuel Beckett tornou-se um nome de referência internacional no teatro e na literatura do século em que nasceu, o extraordinário e trágico século xx. Sua obra traz todas as grandes marcas deste período de conflitos e inovações que preencheram as páginas da história política, social, científica e ideológica da humanidade, revolucionaram as definições geográficas e nacionais de povos e impérios, no Ocidente e no Oriente, mas deixaram o homem, mais do que nunca, a sós, ou, ao menos, face a face consigo próprio. Expressão dessa condição, do inconformismo que ela gerou em relação aos padrões de autoconfiança e de certeza da destinação humana, transmitidos pela tradição em suas diferentes faces, bem como da rearticulação radical da linguagem das artes em termos da insatisfação com a herança estratificada de sua modelização ocidental e da busca de liberdade criadora, a obra do conterrâneo, amigo e interlocutor de James Joyce assumiu, no teatro, uma importância equivalente à escritura joyciana no romance. Entretanto, Célia Berrettini, em seu livro, que a editora Perspectiva traz agora a público, equaciona, num estudo sem paralelo em nossa literatura crítica, não só a contribuição do autor de Esperando Godot para a cena, como descortina para o leitor iniciado ou iniciante nas artes beckettianas uma visão ao mesmo tempo ampla e precisa das várias modalidades que compuseram as feições deste espírito tão irlandês, tão francês e tão universal que foi Samuel Beckett: Escritor Plural.