Na vida existe a ambiguidade, por um lado, as coisas mais simples e mais delicadas estendem-se à vista, no céu azul e aberto, na figura dos pássaros livres assoprando suas canções, no entanto, os passarinhos, figuras tão frágeis, perdem suas forças na impossibilidade de voar amplamente, sendo condenados pelas prisões das gaiolas e pela incapacidade de sustentação por seu corpo frágil e definhado. No mesmo sentido, os seres humanos são como pássaros, quanto mais livres e espontâneos, mais belos. Suas canções de felicidade conseguem encantar na simplicidade da sintonia entre natureza e humanidade, uma sincronia que existe quando o homem está assim, feliz e livre, no entanto, feito pássaro, a fugacidade da felicidade cede surrada para o pesado das frustrações, “Cortante como a rigidez / do cão morto na sarjeta, / o vizinho que / se suicidou”. A liberdade em contraponto a prisão, são explanados no poema, no contraste entre a natureza magnética, quando o eu lírico, fica da sua janela, a contemplar o vento soprando a copa espessas das árvores, atitude observadora que lhe traz satisfação, e por outro lado, as prisões da humanidade surgem em versos com referências a mitos antigos, como o de Narciso, aquele que se encanta obsessivamente pela sua própria imagem. O “Azul” é infinitamente amplo, distante de uma forma incompreensível para o humano, no entanto é também sempre fixo acima da Terra. A obra reverencia e almeja esta coisa quase incognoscível chamada liberdade, mas a sobriedade de Marília Lima, a faz versar sobre a tristeza do fato das coisas mais incomensuráveis reterem-se nas pedras do caminho, “Mas a manhã estava fria / a calçada era de pedra, / sobre a pedra, teu corpo, os olhos fechados”.