Desde a primeira linha estamos mergulhados nesse universo imprevisível, quando um publicitário arrogante descobre, por meios kafkianos, que morreu num acidente de avião. Giovani é um patriarca que se acredita no controle de todas as situações. A sua própria morte traz uma ruptura tão radical que a visão que ele tinha de própria família se estilhaçará nos capítulos seguintes. O foco desloca-se, então, para a esposa, a filha, a empregada. Dialogando com uma tradição literária de romances fragmentados entre vários pontos de vista - Enquanto agonizo, de William Faulkner, A visita cruel do tempo, de Jennifer Egan -, João Saraiva dá voz a personagens em busca de uma maneira de expressão muito distante do jugo racionalizante e totalitário da figura paterna de Giovani. O recurso, para além dos efeitos mais óbvios, abre as portas da experimentação, permitindo que Saraiva mescle diversos gêneros literários e registros linguísticos num só texto. O resultado é complexo, esfacelado e poderoso.