As duas últimas décadas do século XX viram ascensão da ideia de cultura a um duplo primeiro plano: o das políticas públicas e o do mercado, neste caso de um modo ainda mais intenso que antes. O papel de cimento social antes exercido pela ideologia e pela religião, corroídas em particular na chamada civilização ocidental, embora não neutralizadas, foi sendo gradualmente assumido pela cultura, tanto nos Estados pós-coloniais como, em seguida, nas nações subdesenvolvidas às voltas com os desafios da globalização e decididas ou resignadas a encontrar na identidade cultural uma válvula de escape. Do lado do mercado, o vertiginoso crescimento do audiovisual (cinema, vídeo, música) colocou a cultura numa situação sem precedentes no elenco das fontes de riqueza nacional. E a esse cenário, no primeiro ano do século XX, os atentados terroristas realizados em território norte americano acrescentaram novos elementos. A questão cultural assumiu contornos inéditos que expuseram seus componentes de negatividade ali onde antes se costumava enxergar apenas positividades. Antigas concepções de cultura revelam-se inadequadas, ao mesmo tempo em que um processo de domesticação da cultura torna se necessário redefini-la diante de pelo menos uma outra dimensão humana antes por ela abrangida: a arte.