O volume intitulado Transcendência do Mundo ocupa um lugar central na nova edição das Obras Completas do filósofo Vicente Ferreira da Silva. Além dos temas já trabalhados, encontram-se aqui reunidos seus ensaios sobre religiões, arte, poesia e literatura, bem como suas teses extremamente originais sobre o pensamento mítico, ou seja, a fase mais madura de suas investigações. Refletindo a fase conhecida como mítico-aórgica, o filósofo se volta sobre a própria abertura desocultante do ser, que nos possibilita os diversos mundos possíveis. Dessa maneira, ocupa-se acima de tudo com as hierofanias que fornecem ao homem os diversos modos de aceder ao real e, por conseguinte, instauram os próprios regimes históricos no interior dos quais a humanidade desempenha suas potencialidades. No interior da temporalidade, as doações de sentido originais é que promovem os desempenhos pensáveis de tudo o que é ou pode ser pensado. As fascinações míticas é que produzem a abertura na qual a filosofia baliza os seus limites ou se ultrapassa a si mesma. Nesse sentido, a fenomenologia das formas assumidas pela filosofia é subordinada à anterioridade ontológica de suas hierofanias, ou seja, às modulações divinas de suas condições prévias de aparição, instauradas pelas aberturas míticas. Esse movimento, ao contrário do que se crê, nunca é retilíneo. Ora se dá como revelação de uma nova época humana, ora se desvia em direção à inautenticidade, quanto mais se distancia de suas matrizes instauradoras. Aqui já não estamos no domínio da filosofia da história e muito menos de uma história da filosofia, mas sim no coração de uma meta-história e nas regiões luminosas e meta-humanas que são a nascente e o fim do próprio pensamento.