Considerado por muitos o "Leonardo da Vinci russo", Pável Floriênski (1882-1937) foi matemático, filósofo e inventor, além de teólogo e padre da Igreja Ortodoxa. Frequentador dos círculos simbolistas de Moscou no início do século XX, engenheiro na Rússia pós-revolucionária, e depois vítima das perseguições políticas do stalinismo, Floriênski tem no ensaio A perspectiva inversa (1919) - publicado pela primeira vez no Brasil - um de seus mais importantes legados. Antecipando questões fundamentais da história da arte no Ocidente, o pensador russo coloca em xeque o domínio da representação objetiva da realidade, e do observador como um ponto de vista estático e abstrato. Floriênski não apenas demonstra que as opções artísticas dos pintores de ícones, rudimentares aos olhos contemporâneos, não eram fruto da ignorância das técnicas que a Idade Moderna viria a difundir, como também sustenta que alguns dos melhores exemplos da arte renascentista devem muito de sua grandeza justamente à transgressão, consciente e sistemática, da perspectiva linear. Sua análise do papel do corpo na relação com o espaço e o tempo, e a noção de que a arte deve pautar-se por uma compreensão integral da realidade têm encontrado ressonâncias nos projetos de diversos artistas da atualidade, bem como na trajetória do cineasta Andriêi Tarkóvski (1932-1986), um de seus mais notórios seguidores.